O corpo do papa Francisco foi transferido nesta quarta-feira, 23, para a Basílica de São Pedro, para onde um fluxo de mais de 20 mil fiéis já se direcionou no afã de fazer suas últimas homenagens. É um dos muitos ritos fúnebres envolvidos na despedida do pontífice falecido na segunda-feira, mas o mundo inteiro está de olho no que vai ocorrer após nove dias de luto oficial: o conclave processo imbuído de tradições milenares para a sucessão do bispo de Roma.
Pode levar algumas semanas até que suba pelos ares a fumaça branca que indica que uma escolha foi feita pelo Colégio Cardinalício. No entanto, as especulações estão a milhão. Se Francisco fez história ao se tornar o primeiro pontífice da América Latina, há agora um burburinho crescente de que o próximo líder do rebanho de 1,3 bilhão de católicos provavelmente virá da Ásia. Um dos favoritos na disputa é o cardeal Luis Antonio Tagle, das Filipinas, cuja atenção dada aos pobres e minorias renderam-lhe o apelido de “Francisco asiático”.
Trajetória ascendente
Tagle, 67 anos, é apenas o sétimo filipino a se tornar cardeal, tendo sido nomeado pelo papa Bento XVI em 2012. Na época aos 54 anos, ele foi um dos mais jovens a ser alçado a um dos mais altos postos na hierarquia religiosa.
O avô paterno de Tagle era de uma família filipina de classe alta, enquanto sua avó materna era de uma família chinesa abastada que imigrou para as Filipinas. Ele é um de dois filhos e atende pelo apelido “Chito”, que também aparece em seu perfil no X (ex-Twitter). Enquanto estava estudando para se tornar médico, foi “enganado” a considerar o seminário, de acordo com o Relatório do Colégio de Cardeais. Agora, ele ri de como as “piadas” de Deus podem influenciar a vida de uma pessoa.
Os jesuítas tiveram influência fundamental em sua vida, tendo frequentado escolas desta vertente. Em 1982, Tagle foi ordenado padre pela Arquidiocese de Manila. Tornou-se líder espiritual e professor de um seminário local e, posteriormente, reitor de 1983 a 1985. Também foi enviado por seu bispo aos Estados Unidos, onde obteve sua licença em teologia, e retornou às Filipinas na década de 1990. Bento XVI o elevou a arcebispo de Manila em 2011 e, um ano depois, virou cardeal.
Com o passar dos anos, sua proeminência cresceu. Em 2015, Tagle tornou-se presidente da Caritas Internationalis, a instituição de caridade do Vaticano e a segunda maior rede de ajuda humanitária depois da Cruz Vermelha. Ele foi reeleito ao cargo em 2019. Papa Francisco teria sido “arrebatado” por sua liderança.
Foi em 2019 que Francisco convidou o cardeal para estabelecer-se em Roma como prefeito da Congregação para a Evangelização dos Povos, responsável pelo trabalho missionário da Igreja. Dois anos depois, elevou o religioso a cardeal-bispo, o que na época foi encarado como um aceno a um possível sucessor.
“Papa Francisco Asiático”
Tagle é conhecido por suas visões progressistas. Ele é articulado e um bom comunicador, e usa redes como Facebook, Twitter e YouTube para divulgar sua mensagem. Um conhecido defensor dos pobres nas Filipinas, líder de campanhas por questões sociais, foi apelidado de “Papa Francisco Asiático” e aclamado pela mídia como a “voz dos pobres”.
Francisco fez grandes gestos em direção à aceitação de católicos da comunidade LGBTQIA+, fazendo história no pontificado. O cardeal filipino, por sua vez, também criticou as “palavras duras” da Igreja Católica contra gays e casais divorciados. Em uma conferência em 2022, Tagle afirmou que as igrejas devem ser abertas a todos, porque “questões étnicas e culturais arruínam o lar espiritual” e atitudes “populistas” ameaçam o significado próprio da palavra “povo”, ecoando também a defesa de Francisco aos imigrantes.
E assim como o falecido papa, Tagle é conhecido pela simplicidade. No seminário nas Filipinas, onde morou por vinte anos, seu quarto não tinha ar-condicionado nem televisão. Quando foi nomeado bispo, não passou a andar de carro: continuou circulando de ônibus ou jeepney, um transporte público popular no país asiático.
Críticas
Tagle, porém, foi criticado por fazer comentários a respeito do regime do ex-presidente filipino Rodrigo Duterte, recém preso após mandado do Tribunal Penal Internacional (TPI). Em setembro de 2016, o cardeal concedeu uma entrevista de rádio na qual fez questionamentos indiretos às execuções extrajudiciais durante a política de “guerra às drogas” de Duterte. O jornal filipino Manila Standard disse sobre o então Arcebispo de Manila: “O cardeal Tagle permitiu que a Igreja se envolvesse em política partidária. Ele também criticou muito o então presidente Rodrigo Duterte. O que Tagle fez violou a separação entre Igreja e Estado, prevista na Constituição.”
Na mesma entrevista, também se manifestou contra o aborto, causando surpresa (embora nesse sentido não se afaste tanto de Francisco. Em 2015, concedeu o perdão a grávidas que interromperam a gestação, sem diminuir a esperada e natural aversão ao ato: “O aborto é um homicídio, gesto criminoso”, escreveu em autobiografia.)
“Muitos estão preocupados com as execuções extrajudiciais e nós deveríamos estar… Mas espero que também estejamos preocupados com o aborto. Por que poucas pessoas se manifestam contra o aborto? Isso também é assassinato”, disse Tagle na época.
No Vaticano, sua reputação foi abalada quando Francisco demitiu a diretoria da Caritas Internationalis, após uma avaliação externa ter constatado problemas de gestão e moral na sede. Foi o próprio cardeal que solicitou a avaliação, mas também foi exonerado de suas funções.
Mesmo assim, Tagle é o favorito do conclave nas principais casas de apostas. Sua idade pode ser um fator decisivo: relativamente jovem, pode tanto atrair como afastar votos por essa razão – afinal, poderia ter um longuíssimo papado. Será que ser próximo de Francisco será o suficiente para pesar a balança? A ver as cenas dos próximos capítulos.
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