As apostas contra os EUA ganharam força nesta segunda-feira (21) diante da preocupação de que Donald Trump vá cumprir a ameaça de demitir o presidente do Federal Reserve, Jerome Powell, e adotar políticas que podem levar a uma recessão.
As ações americanas caíram (-2,36% para o S&P 500). O dólar também. Os títulos do Tesouro apresentaram desempenho misto, com os de prazo mais longo em queda e os de curto prazo em alta. Investidores estão lidando com o risco de uma possível demissão de Powell, algo que a Casa Branca disse na semana passada estar avaliando, além das implicações das políticas de Trump para a maior economia do mundo.
“Num momento em que o governo já trouxe níveis de incerteza cada vez maiores para as perspectivas econômicas, qualquer tentativa de remover Powell aumentará a pressão negativa sobre os ativos dos EUA”, disse Ian Lyngen, chefe de estratégia de taxas de juros dos EUA no BMO Capital Markets.
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Trump reiterou na segunda-feira, em uma postagem na Truth Social, seu apelo para que o Fed reduza as taxas de juros, escrevendo: “‘Cortes preventivos’ nas taxas de juros estão sendo pedidos por muitos.”
Embora juristas afirmem que um presidente não pode demitir facilmente o presidente do Fed — e Powell já tenha dito que não renunciaria se fosse pressionado por Trump —, a especulação já está prejudicando os ativos americanos. As tarifas comerciais agressivas impostas por Washington também alimentaram temores de recessão e dúvidas sobre a posição dos títulos do Tesouro como porto seguro.
A combinação de riscos aumenta as preocupações sobre os rumos do crescimento e da inflação — e sobre como o Fed conseguirá equilibrá-los. Embora o mercado já precifique pelo menos três cortes de juros nos EUA este ano, o ex-presidente do Fed de Nova York, Bill Dudley, escreveu em uma coluna da Bloomberg Opinion que os formuladores de política monetária provavelmente agirão mais lentamente do que o esperado.
Índice do dólar toca o nível mais baixo desde 2023
O Bloomberg Dollar Spot Index, que compara o dólar com outras moedas fortes, caiu até 1%, atingindo o menor nível desde o final de 2023, antes de amenizar um pouco a queda. O iene se fortaleceu para um patamar não visto desde setembro, enquanto o euro subiu para o nível mais alto em mais de três anos.
A moeda europeia está sendo negociada em torno de US$ 1,15, próxima das projeções mais otimistas dos estrategistas para o final do ano. O iene, em cerca de 140,50 por dólar, está mais forte do que a mediana das previsões de fim de ano (143), segundo dados da Bloomberg.
“As especulações de Trump sobre a possibilidade de demitir o presidente do Fed, mesmo que não se concretizem, já constituem para a comunidade internacional uma ameaça significativa à independência do banco central americano e, por extensão, ao status do dólar como moeda de reserva segura”, disse Helen Given, operadora de câmbio da Monex.
“Se os EUA entrarem em recessão com um banco central que não pode ou não consegue agir de forma independente, há uma chance de que a recessão seja agravada, aumentando ainda mais as preocupações do mercado”, acrescentou.
No mercado de opções, os operadores estão mais pessimistas com o dólar do que em qualquer momento desde o início da pandemia. O prêmio pago para se proteger contra a queda da moeda americana, em comparação ao posicionamento para alta, atingiu o maior nível desde março de 2020.
A venda de ativos americanos se intensificou na segunda-feira depois que o diretor do Conselho Econômico Nacional, Kevin Hassett, afirmou na sexta-feira que Trump estava estudando o assunto, após reportagem apontar que o presidente estaria explorando essa possibilidade.
Vários fundos de hedge estiveram entre os que venderam dólares na segunda-feira, segundo operadores familiarizados com as transações, que pediram anonimato por não estarem autorizados a falar publicamente.
Segundo dados da Comissão de Negociação de Futuros de Commodities (CFTC), os fundos de hedge estão agora no nível menos otimista com o dólar desde outubro. Embora os rumores sobre Powell estejam afetando o sentimento do mercado, alguns analistas afirmam que a guerra comercial em deterioração continuará sendo o principal motor do movimento no câmbio.
“A independência do banco central é extremamente valiosa — não é algo para se dar como garantido, e é muito difícil de recuperar se for perdida”, disse Will Compernolle, estrategista macro do FHN Financial em Chicago. As “ameaças de Trump contra Powell não ajudam a confiança dos investidores estrangeiros nos ativos dos EUA, mas ainda acredito que as atualizações sobre tarifas são o principal fator”, afirmou.
As quedas na segunda-feira não se limitaram ao dólar. As ações americanas também recuaram, enquanto a curva dos rendimentos dos Treasuries se inclinou: os rendimentos dos títulos de dois anos caíram 5 pontos-base para 3,75%, enquanto os dos títulos de 30 anos subiram 11 pontos-base, para 4,91%.
O prêmio adicional que os investidores exigem para deter Treasuries de 30 anos em relação aos de dois anos aumentou por nove semanas consecutivas — uma sequência registrada apenas uma outra vez desde que a Bloomberg começou a compilar esses dados, em 1992. No início do pregão de segunda-feira, a tendência de inclinação da curva foi reforçada por uma forte demanda pela ponta curta, com uma grande operação em futuros de dois anos.
Os alertas dos estrategistas de ações de Wall Street vêm se acumulando à medida que a guerra comercial promovida por Trump mina as perspectivas de crescimento econômico e lucros nos EUA.
Estratégias do Citigroup Inc. reduziram na semana passada sua visão sobre ações americanas, dizendo que as “rachaduras no excepcionalismo dos EUA” vão persistir. Eles se juntaram a Bank of America Corp. e BlackRock Inc., que também se tornaram mais cautelosos com o mercado acionário nos últimos dias.
“O último catalisador para a venda de dólares pode ter sido a pressão sobre Powell, mas a realidade é que nem seria necessário um novo motivo para justificar a venda do dólar”, disse Gareth Berry, estrategista da Macquarie em Singapura. “O que já aconteceu nos últimos três meses já é motivo suficiente para esperar que a venda do dólar americano continue, talvez por meses.”
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