Este texto foi escrito por um colunista do TecMundo; saiba mais no final.
Vivemos uma crise de saúde mental no Brasil, de acordo com dados divulgados pelo Ministério da Previdência Social. Tivemos o maior número de afastamentos do trabalho por ansiedade e depressão em 10 anos, totalizando quase meio milhão em 2024. Um aumento de 68% do último ano para cá. Os afastamentos por ansiedade e depressão lideram. Você sofre com ansiedade ou com sintomas depressivos?
Dentre as possíveis causas estão cicatrizes da pandemia, carga genética, sobrecarga de trabalho, fatores ambientais e estilo de vida das pessoas: sono e alimentação ruins, estresse, comportamento sedentário e inatividade física. Porém, é no próprio estilo de vida que temos uma forma de tratamento: exercícios físicos.

Mova o corpo, cure a mente
Se você morar no Canadá e apresentar sintomas de depressão em níveis leves a moderados e procurar ajuda, pode ser que seu médico apenas lhe recomende a prática de exercícios físicos, pois essa é a orientação do CANMAT (Canadian Network for Mood and Anxiety Treatment). Essa é uma medida inovadora e que não põe o exercício como uma panaceia (cura para todos os males), mas reconhece que mover o corpo pode curar a mente, pois as evidências científicas mais atuais demonstram isso. Entretanto, pacientes com sintomas moderados a graves tem indicação de exercícios e medicamentos antidepressivos.
Além disso, o exercício pode atuar junto com a psicoterapia ministrada por um psicólogo. Segundo Jacob Meyer, pesquisador da Universidade de Wisconsin, “o exercício pode preparar ou ‘fertilizar’ o cérebro para se envolver em trabalhos emocionalmente desafiadores que podem acontecer durante a psicoterapia”.
Em geral, a tríade de tratamento medicamentos, psicoterapia e exercícios físicos é recomendada, bem como a orientação profissional em cada área.

Por que ainda falamos pouco sobre exercícios para saúde mental?
Existem várias razões que explicam a baixa atribuição dos benefícios psicológicos aos exercícios, sendo este uma ferramenta terapêutica negligenciada na área da saúde mental. Um dos motivos é que médicos e psicólogos, os profissionais na linha de frente, tradicionalmente não recomendam a prática aos seus pacientes. Pesquisas mostram que médicos mais ativos tendem a recomendar mais exercício aos seus pacientes. E aí, seu médico é um praticante de exercícios e recomenda a prática?
Um grande dificultador pode ser a poderosa indústria farmacêutica, que não tem interesse em algo natural e barato para o tratamento, como o exercício. Representantes comerciais das empresas de medicamentos visitam os médicos. Ninguém “representando o exercício físico” os visita.
Talvez a indústria de medicamentos odeie o exercício físico, tanto por ele prevenir e tratar tantas doenças — o que reduz o uso de remédios, como por não conseguir mimetizar completamente os efeitos multissistêmicos que o movimento corporal causa, em uma cápsula, através do que chamamos de “mimetização do exercício”.
Ainda, as pessoas em geral relacionam o exercício somente aos componentes da aptidão física, como força e hipertrofia na musculação e condicionamento físico na corrida, e não para saúde cerebral e mental. Mas é hora de mudar.

Recomendações: Quando? O quê? Quanto? Como? Com quem?
Nem toda atividade física ou exercício físico traz benefícios para a saúde mental. Isso vale até mesmo para estudos com ratos. Quando o exercício foi forçado nos animais, eles se tornaram fisicamente aptos, mas o cérebro deles sofreu, pois ficaram mais ansiosos. A livre escolha para se exercitar é fundamental para efeitos positivos. Portanto, movimentar o corpo durante seu lazer é uma base importante.
A partir disso, para uma boa resposta psicológica, os pacientes devem realizar atividade física de três a cinco vezes por semana, sendo a regularidade o fator mais importante. Em relação ao tempo, sessões de 45 a 60 minutos são mais efetivas para melhorar o humor e reduzir sintomas depressivos, mas sessões curtas – de 10 a 30 minutos, também podem funcionar. O nível de esforço? Algo moderado a vigoroso, em que se possa falar, mas não cantar durante o exercício. O tipo de exercício? Pouco importa, pois a preferência da pessoa deve ser respeitada. Se estiver sofrendo com sintomas de depressão, quatro modalidades foram ainda mais eficazes, segundo estudo recente: caminhada, corrida, treinamento de força e Yoga.
Um fator-chave para o sucesso é a socialização, especialmente com um profissional. Isso aumenta o potencial dos efeitos, sendo que o número necessário para tratar (NNT) do exercício é de apenas 2, mas de 1,6 quando esse é supervisionado, ou seja, para cada 1,6 pessoas tratadas com exercício supervisionado, espera-se que pelo menos 1 tenha redução nos sintomas.
Considere uma sessão de exercícios uma oportunidade de distração de pensamentos negativos, uma chance de melhorar seu humor de forma imediata e de se sentir melhor.
É engano pensar que há uma separação entre corpo e mente, pois a forma que cuidamos ou não de nosso corpo afeta diretamente algo que está dentro dele: o cérebro.
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Fábio Dominski é doutor em Ciências do Movimento Humano e graduado em Educação Física pela Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC). É Professor universitário e pesquisador do Laboratório de Psicologia do Esporte e do Exercício (LAPE/UDESC). Faz divulgação científica nas redes sociais e em podcast disponível no Spotify. Autor do livro Exercício Físico e Ciência – Fatos e Mitos.
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